Uvas verdes
Diante do progresso, sucesso, fama ou confortável situação financeira, justificamos, racionalizamos ou desvalorizamos méritos alheios. À maneira dos personagens criados pelo fabulista grego Esopo, costumamos menosprezar o êxito, taxando-o de favoritismo, sorte, proteção de divindades, privilégio ou fruto do destino, simplesmente porque não chegamos ao mesmo sucesso. Falamos em inspiração e não percebemos a transpiração, porque não chegamos à consciência de que conquistas dependem de trabalho, esforço e persistência. Lamentamos nunca estar, como eles, no lugar certo, no momento certo.
Parece que esse misto de inveja, despeito e vitimização tem sérios efeitos colaterais. Tendemos a entronizar e idolatrar os bem-sucedidos, como se fossem criaturas dotadas de graça ou prerrogativa especial, das quais não somos dignos, e não consideramos o profundo esforço que cada um despendeu na caminhada empreendida.
Isso se chama submissão passiva, de quem aceita de braços cruzados o que estaria previsto por um inevitável destino. Ao contrário, a submissão ativa implica aceitar as dificuldades e desafios, para depois assumir postura corajosa e determinada para superá-los.
Missionários da Revelação1
Essa falta de amor-próprio não se aplica apenas às coisas materiais. Perante os que se destacaram no campo do espírito também apresentamos baixa autoestima e idolatria, como se elas fossem criaturas perfeitas e dotadas de superpoderes. Ao nos lembrarmos de Madalena, Paulo de Tarso, Pedro, Marcos e outras figuras do Evangelho, tributamos merecidos amor e respeito a esses grandes vultos do caminho cristão, mas sem reconhecer as dificuldades que enfrentaram.
Achamos que eles somente tiveram facilidades, pois, afinal de contas, conviveram com Jesus. Falsa interpretação dos seus sucessos e dificuldades. Bastará voltar um pouco no tempo e encontraremos os dolorosos enganos de Madalena, as perseguições de Paulo, a negação de Pedro e as hesitações de Marcos. Não obstante, superaram suas fraquezas e se firmaram em suas grandiosas missões graças ao profundo esforço que despenderam para aprender e aplicar com Jesus.
Não brinco mais2
Ao enaltecer essas figuras grandiosas, taxamo-nos de incapazes, como se o espaço terrestre fosse dividido entre deuses e devotos. Esse falso raciocínio supostamente justificaria nossos melindres e nossa falta de persistência. Senão vejamos: existem criaturas que ora creem, ora descreem. São fiéis frequentadores do templo, da igreja ou do centro espírita, mas, porque julgam que suas preces não são ouvidas, afastam-se, alegando que aquela casa de oração é fraca. Trabalham com dedicação em favor dos desalentados. No entanto, quando esbarram no espinho da ingratidão, concluem que seu trabalho é inútil e desnecessário. Parecemos crianças que, ao menor sinal de contrariedade, saem amuadas, dizendo que não brincam mais.
Diz Emmanuel que o exercício do amor verdadeiro não pode cansar o coração. O mal pode até extenuar o espírito, mas o bem revigora sempre.
Vacina
Quem semeia melindres, colhe desilusões. Compenetremo-nos de que os problemas da alma não se resolvem em horas, dias ou semanas. Suas soluções exigirão persistência e tenacidade mantidas por décadas ou até por mais de uma existência.
Por isso, amigo leitor, jamais canse de fazer o bem. A boa colheita exigirá continuidade e persistência. Os que venceram não foram escolhidos ou privilegiados. Vacinaram-se contra o despeito por meio de permanente sintonia com o Alto. Tinham plena convicção de suas dificuldades, mas, acima de tudo, de que Deus jamais colocaria em seus ombros peso superior às suas forças.
Referências
1 – EMMANUEL. Pão nosso. Psicografia de Francisco Cândido Xavier. 13. Ed. Agosto de 1987. Lição 33. Pg. 77. “Trabalhemos também”. FEB.
2 – EMMANUEL. Vinha de luz. Psicografia de Francisco Cândido Xavier. 10. Ed. Agosto de 1987. Lição 82. Pg. 177. “Sem desfalecimentos”. FEB.